terça-feira, fevereiro 19, 2008

A Última Noite?!


Mítica, a noite do passado Sábado… A Discoteca Primo Xico encerrou as suas portas para sempre, ou reformulando, o espaço físico onde funcionou durante 25 anos não mais vai ser o palco das noites de Sábado da nossa cidade. Digo o palco, porque foi mesmo o único palco durante largos anos… Foi tão simplesmente: a Discoteca.

Começo por tentar descrever a noite de Sábado… É difícil: dizer que as paredes do velhinho edifício voltaram a gemer água é pouco, que as portas voltaram a balançar com os decibéis, ou que chegar ao bar era tarefa complicada, continua a ser pouco, que as casas de banho escorregavam assim como o suor nas testas e o álcool nas gargantas, que o contacto humano era inevitável… Pouco! Agora dizer que houve abraços de arrepio em reencontros com amigos, que eram também reencontros com momentos vividos ali, naquele sítio. Que as lágrimas que rolavam em algumas faces eram de saudade e melancolia, mas também de exultação e cumplicidade, uma amálgama de sentimentos díspares e profundos. Esta já é uma possível descrição do que se passou…

Ao leitor que considera excessivo o uso de tanta adjectivação, posso sempre retorquir alegando que a minha visão é parcial e que a sobriedade já não imperava em mim a certa altura da noite. Não tanto pelas cervejas que ia entornando, ora na garganta, ora na pista em mais um efusivo brinde, mas mais pelo turbilhão de emoções que experimentava e que me iam turvando a percepção. Alguém disse um dia que recordar é viver ou que a vida é aquilo que tu te lembras dela (Gabriel Garcia Marquez?). Pois essa noite foi um hino ao passado numa derradeira viajem pelas noites curtas, mas intensas do Primo Xico.

A certa altura toda a gente lá ia (e aqui “toda a gente” não é exagerar muito). Lembro-me bem, o primo Xico à porta, enfiado no seu casaco, a lamber o dedo com que a seguir separava do molho dos cartões, aquele que entregava a quem queria entrar. Azul para o menino, rosa para a menina. Entrava-se e era tentar chegar ao balcão, entregar ao João Pedro o casaco para guardar, falar ou não do Sporting (se tivesse perdido sim), cumprimentar a dona Maria Maurícia, que já ia servindo um Whisky a alguém e pedir talvez à Telma ou ao João José a primeira bebida da noite: “Um Gin Tónico, se faz favor.” (a partir de certa altura comecei a gostar de Gin, mas podia ser outra coisa…) Seguia em direcção à pista. A rapaziada da Tramaga à direita, debaixo dos arcos o pessoal do cabelo à playmobil, a malta da geração acima, por baixo do DJ, que podia ser o Henrique ou o João Ernesto, ou mesmo o German, ultimamente. Chegava ao spot da minha rapaziada: cumprimentos outra vez, ver quem estava, anotar quem faltava, abraços e outras manifestações, sobretudo de afecto… Se chegasse cedo, corria o risco de a pista ainda não estar aberta. Era embaraçoso, mas havia sempre quem se chegasse à frente e perdesse a vergonha. Quanto mais não fosse porque o tempo era precioso, afinal de contas eram só duas horinhas e meia de discoteca. Depois era ver o tempo a voar, entre mais uma bebida, uma piscadela de olho naquela miúda, uma dança atrevida aqui, um abraço acolá e acabava a música. Toda a gente sabia quando chegava a última música, era fácil, era um slow. O famoso slow do Primo Xico. Havia quem passasse o tempo todo a congeminar um plano para dançar o slow com determinada pessoa. Era giro… Depois era a fila para pagar e o Xico a tentar expulsar, com a sua paciência, os mais que muitos que ali continuavam, quase sem darem conta do final da música, “Vamos embora rapaziada.”

A título pessoal, a discoteca nem foi muito marcante… Reunia-me lá com o pessoal de Sábado em Sábado, religiosamente. E convivíamos, partilhávamos, aprendíamos, experimentávamos, imaginávamos… Grande parte das relações com o sexo oposto começaram lá, inclusivamente a relação que hoje vivo. Sim, revelo aqui sem pejo, que me declarei à minha alma gémea na discoteca Primo Xico. Lembro-me tão bem dessa noite, sobretudo de como me tremiam as pernas… Epah, então se calhar até foi marcante…

Sinto que podia continuar a descrever e a contar histórias da Discoteca durante mais uns parágrafos, mas vou terminar (finalmente, não é?!), deixando aqui uma homenagem ao sítio e às pessoas que a fizeram e fazem, sobretudo porque me viram crescer a mim e a muitos outros filhos de Ponte de Sor, como eu. Obrigado!

15 comentários:

Anónimo disse...

Parabéns Rogério!!!!!

Magnífico texto.... foi sem dúvida uma noite inesquecível para todos nós...
Foram muitos momentos que o Primo Xico e todo o seu Staff nos ofereceram... naquele espaço todos nós fomos muito felizes.... pelo menos 1 dia.....
Obrigado PX !!!!!!!....

Anónimo disse...

Primo xico allez primo xico allez =)

Anónimo disse...

Aquela noite ficara para sempre na minha memória... bem como este texto!
Um abraço Primo

Anónimo disse...

a ultima ceia nao sera esquecida como alguem disse essa noite!! mt bom texto abr

Unknown disse...

Obrigado Rogério!!!!!

Para nós foi um privilégio enorme ver crescer toda uma geração, que tal como tu, nos enche de orgulho.
Como disse Shakespeare, "os meus amigos são a minha riqueza"....

Beijinho

Catarina Pita

Anónimo disse...

Grande texto Rogério, parabéns. Nunca me irei esquecer daquela noite, a melhor de sempre. PX obrigado por tudo.

Anónimo disse...

Tive pena, não estive presente, mas com este texto imaginei-me a percorrer o trajecto entre o balcão e o canto por baixo do Dj com o copo na mão.....xiiiii, incrivel, muito bom.
PXico, dantes, agora e sempre, nem que seja pelos magníficos momentos de memória. Parabéns e obrigado.
Ass: BECÕES (um representante de mais um grupo de amigos de UMA geração)

Anónimo disse...

descrição perfeita!!

sem palavras, foi uma noite simplesmente arrepiante!!! AMEI!

obrigado Roger por teres conseguido descrever tão bem o que eu senti! tirando a parte da Daniela, claro!!

espero poder repetir mais noites com todas aqueles pessoas!!

abraço!

Anónimo disse...

Rogério, obrigado pelo texto e pela excelente descrição.
Realmente fiquei sem palavras, ainda agora me deixa muitas lágrimas nos olhos ao ler.
Para os Nossos Verdadeiros AMIGOS a Discoteca vai ficar na memória de todos como um marco importante das Nossas Vidas.
Resta-me apenas agradecer, Obrigado.
Henrique Granja

Ricardo disse...

Bem, eu como "vizinho" de Abrantes, serei mais filho da Jet Bee, mas tive o prazer de conhecer o primo Xico uma vez. Quantos amores, desamores, traições, pugilatos, depressões, alegrias, alianças, acordos, mentiras, meias-verdades, verdades, nostalgias terão ficado entre as paredes a "gemer água", nesses Sábados de duas horas e meias? Só o primo é que sabe.

Um abraço.

Anónimo disse...

"Vão dar uma volta, mais tarde talvez dê para entrar"

Puta que pariu sitios como este, onde porteiros que se confundem com donos, nos tentam condicionar liberdade de escolha, isto porque realmente eram os únicos, na década de 80, e conseguiram
sê-lo até ao seculo XXI.

Talvez um dia a democracia chegue a esta terra, que era atrasada em 1985, mas que vinte e tal anos depois tenha dado um passo decisivo no sentido da evolução.

Não é um primo "X" qualquer que vai decidir por mim.

Viva a Liberdade

Anónimo disse...

Apesar de durante muitos anos não ter concordado em ser a unica discoteca na Ponte e ter criticado isso mesmo em frente a porta. Que paciência que o Xico tinha para esta malta jovem, sem falar no respeito que toda gente tinha pelo Primo Xico. Não um respeito intimidador de um qualquer Gorila mas um Respeito de Homem para Homem. Toda a Gente lá entrava Rico ou Pobre, Velho ou Novo, Miudo/a ou Quarentona/ão toda gente era igual (e talvez unico sitio na Ponte onde o Bairrismo de Terras era posto de parte, palco de uma coesão social que o Concelho de Ponte de Sor tanto precisa).
5 anos depois ainda me lembro o quanto aquela disco foi infelizmente o palco do ultimo Adeus que dei a Ponte(talvez para um dia voltar )

A verdade é que só sentes falta de uma coisa quando a perdes.

Anónimo disse...

Obrigado Roger,

Eu como tantos outros crescemos lá, quase que fez parte da nossa educação de hoje as noites de sabado à noite no primo xico! Saturday Night Fever!

Apenas esqueceste de dois pormenores, então e a malta da Ervideira? Ah é verdade esses passaram a ir ao ST, que também já fechou! lol, mas esse já se esperava. O segundo pormenor, então e as tardes de matiné?!?
Grande Abraço Roger!!

Alberto Pita (Pitoxoroglü)

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Obrigada primo,compadre,amigo...

Que belo texto!
Eu estava grávida de oito meses nesse dia... As emoções estavam ao rubro mas valeu o sacrifício que foi aguentar a pressão humana do corpo a corpo no emaranhado de gentes.

Também foi lá que teve lugar o pedido que ainda hoje me mantém unida ao meu mais que tudo...

Saudades... Nostalgia... VIDA...

Bem hajam primos Pitas, um obrigada muito especial.

Beijinhos Helena