quarta-feira, abril 25, 2007

O que eu queria mesmo era ganhar o euromilhões.






O exercício de imaginar o que seria se ganhasse o euromilhões é dos que realizo com mais frequência… E como eu, há milhares de pessoas… E quando se trocam impressões numa qualquer mesa de café e chega o assunto euromilhões? Nunca se está menos de meia hora a ouvir e debitar teorias sobre o que fazer a tanto dinheiro.

Há sempre quem diga: “Eu só queria o segundo prémio.” Sim, concordo, o segundo prémio já era bem bom, a vidinha que se leva não tinha que sofrer modificações extremas, que muitas vezes assustam só de imaginar e por sua vez havia margem para quebrar a rotina com mais frequência do que no presente. O que era excelente! Normalmente quem defende a teoria do segundo prémio dá o exemplo do infeliz que ganhou a maior lotaria de sempre nos Estados Unidos e só lhe aconteceram desgraças… Ok, continua a ser um argumento válido. Até porque um comum mortal era bem capaz de ensandecer imediatamente após a tomada de consciência de ter ganho o primeiro prémio. Para além de que, um comum mortal não tem capacidade para sequer entender a verdadeira dimensão do número em questão. Não está habituado a tantos zeros… Se fosse o Belmiro, ou um desses multimilionários, era na boa. Já se habituaram à ideia de brincar ao monopólio e eram mais uns trocos. Não mudavam de vida radicalmente, não tinham que mudar de cidade, emigrar, esconder dos amigos e até família que eram imensamente ricos. Não iam aparecer novos amigos de ocasião, até porque já os têm de certeza. Não teriam que viver o resto dos dias desconfiados das intenções de toda a gente porque já vivem… Moral da história: o euromilhões só devia sair aos que já estão habituados a tanto dinheiro? Não! Esses já não precisam de mais. Então afinal em que ficamos?

O ideal era sair a uma sociedade de amigos, de bons amigos… Isso é que era tabaco! O pessoal todo em altas farras a esturrar a guita toda… Mas isso podia não dar bom resultado, duvido que certas amizades sobrevivessem a esta conjuntura… Havia de haver logo quem se afastasse, até porque também é capaz de fartar a certa altura (ou não!) Mas era na boa, quem quisesse embarcava em cruzeiros de alto luxo, quem quisesse optar por permanecer um mês em cada cidade do mundo em hotéis de 5 estrelas também estava à vontade, podia haver quem quisesse ir ao espaço e rebentar logo com a fortuna toda ou até dá-la para obras de caridade… Fosse como fosse, um dia em cada mês sempre podíamos ir jantar a algum sítio simpático. Em Janeiro um peixinho na Austrália, em Fevereiro umas ostras no Brasil a ver o Carnaval, em Março uma picanha na Argentina, em Abril marisco à descrição no Dubai, Maio podia ser sushi no Japão, Junho em Paris, experimentava-se a nouvelle cuisine francesa (paneleirices, mas pronto quando um gajo pode…). Julho, outra cidade europeia, podia ser na Alemanha, Berlim ou outra, bebíamos umas cervejas (mini sagres, se faz favor…). Agosto, mês do imigrante, podia ser mesmo cá em Portugal, em Lisboa, num desses muito caros tipo Gambrinus ou Tavares Rico. Setembro, na Rússia por exemplo, ligava ao Abramovich para ele nos dar umas dicas. Outubro, na Europa outra vez, numa cidade daquelas que toda a gente diz que adora: Praga, Veneza, Budapeste, por aí… Comíamos qualquer coisita… Novembro, começa a estar frio por cá, podia ser num paraíso tropical qualquer, Seicheles, Maurícias ou outras que tais onde o mar é quente e azul bebé, marisco outra vez. Dezembro em Dezembro diz que Nova York é engraçado, podíamos lá ir. Jantava-se num daqueles sítios que aparecem nos filmes, caros que nem um corno… No ano seguinte variava-se um bocadito, mas a ideia era boa, não?!

Não podia haver desculpas para não ir aos jantares, não é… “Ah, a minha mulher, ah, os meus filhos, ah, reunião.” Ah, o cacete! Cada um tinha o seu jactozinho e enfiava lá a mulher e os filhos e quem tratasse deles (da mulher e dos filhos…). “Ah, tenho uma reconstituição dentária nesse dia…” Traz o dentista no jacto… “Ah, o Benfica joga a final da Liga dos Campeões em Manchester…” “Ok, então vamos a Old Traford ver o jogo, pah!... Na boa, deixa-me só ligar ao gajo que comprou o United, agora não me lembro o nome, mas são dois irmãos, não é? (…) Não, janta-se no estádio, diz que fazem lá uns joaquinzinhos daqui…”

É mesmo isto que acontece: começa-se a imaginar coisas cada vez mais estúpidas e parece que se podia estar a falar sobre como gastar o prémio para sempre… É ridículo!

Será que um gajo cheio de dinheiro até ao pescoço, continuaria a tentar multiplicar a fortuna?! Claro! A ambição não tem limites e dinheiro gera dinheiro facilmente. Era preciso um tipo esforçar-se para o abrasar todo. E por outro lado incrementar a fortuna era de caras (digo eu). Contratava-se ou comprava-se ou constituía-se uma empresa de consultadoria, só para perscrutar oportunidades de negócio em todo o mundo e depois era brincar. Perder aqui, ganhar ali. Uns gajos atentos à bolsa e tal… Imobiliária, hotelaria, industria variada… Uma boa cena era financiar um projecto para implemetar novas formas de energia (renováveis), quer no ramo automóvel, na industria etc. Pronto, lá estou eu… É que uma pessoa voa facilmente e chega-se a resoluções loucas… Não me posso pôr a pensar nisto.

Ok, só mais um bocadinho… Tinha que ser solidário! Quem me está próximo era evidentemente “amparado”. Mas para além disso, constituir uma fundação como o Luís Figo, por exemplo (diz que isso até é bom para os impostos!)… Contratava uma equipa que procurasse saber onde há mais necessidades de ajuda primária, porque matar a fome a uns quantos já não era mau.

Depois era tentar ocupar o tempo: ver os saldos das contas bancárias, estar atento ao programa de concertos mundial, marcar jogos de futebol com o pessoal em estádios que alugava, passear pelos vários pólos de negócio espalhados pelo mundo. Viajar está implícito, não é… Começava a interessar-me por arte e visitava exposições, comprava um quadrozito aqui, uma antiguidade ali. Podia fazer umas colecções tipo o Joe Berardo, enfim… Depois montava um museu, como já havia a fundação era fácil. E assim ia ocupando o tempo. Se calhar organizava, ou mandava organizar aliás, que trabalhar é que não, um festival de música como deve ser... Mas para dar lucro… Metia o Rock in Rio ou o Sudoeste num chinelo! Cá está, já ia na lua outra vez… Vou acabar com isto!

Estes parágrafos provam que é melhor não me sair o euromilhões, não é? Mas pelo sim pelo não, se calhar esta semana chego ao quiosque e digo: “Ó fachavor, é um de dois euros da máquina…”

terça-feira, abril 10, 2007

O conforto único...


Saio de casa de madrugada. Pela frente há 320 Km de macadame para vencer, uma semana de labuta para superar, intuitos e empreitadas, uma rotina solitária e uma distância já usual de quem se ama…

Apenas um conforto: o Alentejo!

O assistir a cento e vinte ao nascer do sol à minha esquerda. A luz que me ilumina o caminho e aquece o interior do carro lentamente. Que descobre os campos que vou displicentemente apreciando.

A cada viagem um novo pormenor… Uma fonte, uma represa, um monte, uma azinheira e uma poupa a passar em voo rasante ao pára-brisas…

É um encher de espírito em cada vislumbre. Até Mora, há a Barragem de Montargil, espelho ainda pouco iluminado que fumega e enche o ambiente de um misticismo sobrenatural. Há boa cortiça em sobreiros valiosos. Depois Pavia, menos densidade de árvores e mais campo verde, com represas aqui e ali, brilhantes. Vacas esquecidas entre erva por pastar e o horizonte, verde, doirado, castanho… O sol já se mostra todo, e sem vergonha reflecte-se ofuscantemente nas gotas de orvalho, que carregam com o seu peso as vadias ervas, dobrando-as.

Sobe-se para Arraiolos e antes da rotunda, a espreitadela à esquerda. Consegue ver-se lá em baixo a pousada, no meio dos campos só rompidos por sobreiros, azinheiras e água aqui e ali… No preciso semáforo das Ilhas dá para beber mais dessa paisagem, agora mais recortada e levemente sinuosa.

A chegada a Évora no avistamento do Arco que me dá as boas vindas. A cidade que primeiramente conheci. Eu ou um eu sem consciência, com saudades de um cordão umbilical e um líquido quentinho a envolver-me. A hora é de tráfego, há gente que tem mais um dia pela frente. Absortos, os transeuntes despenham-se nos passeios e no carro ao lado há quem se ria da mesma piada que eu. É o Markl na rádio… Companhia indispensável. A muralha à esquerda, património da humanidade anunciada e uma dificuldade em tirar aquele macaco do nariz, enquanto o semáforo não fica verde. Á saída, as vinhas… Divididas pelo alcatrão cinzento apenas. Os fios de arame, amparo quando maduras, parecem agora cordas de uma imensa guitarra, tocada pelo astro. Se tivesse som seria uma moda de Carlos Paredes, num dedilhado lento e embalador.

Depois é o Alentejo outra vez. E Beja, também à esquerda. Rotundas, restaurante internacional de logótipo vermelho e amarelo e o quartel à saída. Pelo meio, pessoas que passeiam junto à estrada de fato de treino e eucaliptos frondosos.

A placa anuncia S. Matias, que equivale a dizer sandes de presunto e sumol de laranja, ou leite ucal, porque para mini sagres ainda é cedo… Enfim, bucha e café para acordar! Ou aqui ou na estação de serviço de Almodôvar – menos romântico e mais caro…

O IP2, cento e trinta, cento e quarenta. A densidade de árvores é menor e a planície domina cada vez mais. Casas brancas nos cabeços pintam pontualmente o quadro dinâmico que se esboça.

Um castelo e Portel surge branca. “Bonita esta Vila, qualquer dia, quando tiver tempo entro lá para ver as vistas”, penso…

O betuminoso e a planície conduzem-me, há cruzamentos que são hipóteses, oportunidades de ali ficar, no Alentejo. E há uma pérola à direita, Albernôa. Numa encosta, casas baixas brancas descem a beijar um riacho tímido, que rasga um vale dominado por azinheiras e pedras e ervas e verde e castanho e o branco das casas, tão brancas. Têm antenas mais altas que elas, pitoresca imagem de desequilíbrio e esbelteza descabida. A beleza outra vez ali.

Castro-Verde e a seguir a auto-estrada. Cento e quarenta, cento e cinquenta. Já há pressa em chegar. Admiro os taludes cortados pela útil via e os vales cada vez mais fundos que são superados pelos viadutos quase consecutivos. É a serra e já não é Alentejo. Também é bonito, mas já há pressa e impaciência. Há afazeres à espera e com azar o telefone já vai tocando. É a realidade que me espera. O Alentejo confortou-me e agora estou entregue a mim outra vez. Venha o Algarve!

quinta-feira, abril 05, 2007

Perder

Falta,

Vazio

No quarto frio

O tremor constante

A escuridão…

Alucinações, fraqueza?

Pesadelos, delírios?

Medo!

A falta…

A palavra e o afago

Ternura…

Vazio!

No quarto frio

A luz guiava…

Escuridão!

O tremor…

E o Amor?

Vazio!

Privação antecipada

Do Amor

Ternura…

Vazio!

Ausência

Medo!

No quarto frio

Visões, devaneios?

O tremor…

A voz, a ternura

E o Amor?

Privação precoce

Do Amor…