terça-feira, novembro 18, 2008

Dia B... SLB!


O recente convite para colaborar num Blog dedicado ao Benfica, levou a perguntar-me como, quando e porque é que me tornei um benfiquista. Então recordei-me do episódio que a seguir relato…
Era um dia normal no Jardim de Infância, devia estar ou a tirar cacanhos do nariz, a comer pasta de dentes ou a esfregar o chão de joelhos (com as devidas protecções de napa cozidas às calças, claro).
A certa altura um puto mais velho interpelou-me, num tom altivo e ameaçador e questiona-me sem rodeios sobre a minha preferência clubística. Avançou as únicas duas hipóteses de escolha lógicas: “És do Sporting ou do Benfica?” Naquele tempo nem se mencionava o outro chamado “clube grande”. Não havia quase ninguém do Porto e os poucos que existiam era porque acumulavam outras patologias psicológicas além dessa. O tom intimidador da abordagem surtiu o efeito pretendido e a minha resposta não foi imediata, sobretudo porque havia a suspeita de que iria ser diferente daquela que o opressor queria ouvir. Respondi então a medo: “Sou do Benfica.” Sinceramente naquela altura ainda nem tinha bem a certeza, mas achava que o meu pai era do Benfica, os meus amigos também deviam ser, portanto era a decisão acertada. A minha tomada de posição valeu-me imediatamente um apertão de pescoço quase até à asfixia, a que se seguiu a repetição da pergunta, a repetição da resposta e consequente repetição da tortura. Não sei quanto tempo isto durou, ou quantas vezes se repetiu, mas resisti heroicamente sem me vergar, perante um inquisidor persistente e feroz que ansiava por uma resposta em tons de verde.
Hoje agradeço ao Billy, na altura ainda era só Fernando, que me ajudou a decidir acertadamente naquela que é porventura a primeira grande escolha na vida de um puto de 4 ou 5 anos. Nesse dia cheguei a casa e perguntei ao meu pai, só para ter a certeza: “És do Benfica, não és?”, “Claro que sim, filho”(respondeu surpreso), “E o avô? Também é?”, “Sim, na nossa família toda a gente é do Benfica…” Suspirei aliviado e o meu benfiquismo, que se resumia a uma leve suposição, passou a ser uma convicção, fortalecida pela experiência tortuosa a que tinha sido sujeito.
Refira-se que mais tarde o Billy pagou com juros aqueles apertões de pescoço traumatizantes, tendo sido brindado com bonitas projecções, chaves de braço e outras poesias que tais, quando fomos colegas no Judo. Isto numa altura em que a diferença de idade já não era determinante ou pelo menos proporcional à compleição física e atitude mental.
O meu benfiquismo foi crescendo forte e saudável, o solo era fértil, abundavam nutrientes desportivos e futebolísticos e os resultados em finais de 80, princípios de 90 ainda motivavam putos como eu era. Quando ainda pensava que podia ser jogador de futebol, ao assistir a jogos menos bem conseguidos do meu glorioso, confortava-me realizando o seguinte artifício: “Quando for grande e lá estiver a jogar, não perdemos de certeza…” Outras vezes nem isso me valia e chorava simplesmente. Hoje sei que passei ao lado de um grande carreira (o 107 para o Cais do Sodré, ou para os pontessorenses, a “carrêra pás Galveias”) e sou um benfiquista sofredor. Quem diz sofredor, diz apaixonado, mas não fanático ou doente. Não sou “doente do Benfica”, mas ando muitas vezes constipado, se é que me entendem… Assistir a um jogo perto de mim dizem que é giro, sou conhecido por ter reacções extemporâneas e até talvez desadequadas para um ser que se diz racional… Desde os insultos que dirijo sobretudo aos árbitros, mesmo estando estes dentro do aparelho televisivo e portanto com poucas probabilidades de me ouvir, até à forma como dou por mim a festejar um golo do bem-aventurado (procurei sinónimos de glorioso e achei piada a este). Ora, meus amigos, festejo muitas vezes da seguinte forma: de pé, às vezes aos saltos, gritando muito alto “chupa” e normalmente com os dedos médios de ambas as mãos em riste, movimentando os braços ritmadamente, como se simulasse a introdução dos mesmos, quem sabe, na cavidade anal dos adversários, porque não…(Que mau, é favor não registar esta última parte…)
Fui sócio durante uns anos, mas o meu padrinho, que me pagava as cotas, não gostou de termos perdido o campeonato em 96… Hoje sou “apenas” sócio do Eléctrico Futebol Clube, um dos dois maiores clubes do mundo e penso seriamente em voltar a associar-me ao outro. (Reparem nas aspas no apenas, é importante que reparem…)
Concluindo, sinto que fui bafejado pela sorte no dia em que me apertaram o gasganete, porque isto de ser maior do que os homens não acontece só aos poetas, acontece também aos benfiquistas.